Pensar as cidades através da sua população, principalmente as mulheres e os grupos minoritários, e colocar o povo como agente ativo do planejamento urbano foram algumas das ideias apresentadas pela professora iraniana Faranak Miraftab durante a “Semana de Planejamento e Política Urbana”. O evento, que marcou o Mês de Luta das Mulheres, foi organizado pelo Centro de Estudos em Planejamento e Políticas Urbanas da Universidade Federal do Paraná (CEPPUR-UFPR). Realizado nos dias 27 de fevereiro e 1º de março, no Campus Jardim Botânico e Campus Centro Politécnico da UFPR, contou com o apoio da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA) e do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas do Estado Paraná (Sindarq-PR). A diretora geral do Sindarq-PR, Iara B. Falcade Pereira, que acompanhou o evento representando as entidades, destacou o simbolismo de começar o mês de março e o 8M com a presença e as contribuições feministas internacionais de Faranak.
“Para fazermos um planejamento territorial que atenda as necessidades atuais globais, precisamos colocar o cuidado e a vida no centro das decisões e do desenvolvimento urbano”, explica a professor iraniana. A partir de uma perspectiva de gênero e classe social, ela contextualiza a necessidade de inserir a população e suas ações coletivas no desenvolvimento das cidades. Durante a palestra, através de exemplos no Brasil, México e Peru, Faranak mostra como as comunidades, com suas próprias ações organizadas e autogestadas, podem desenvolver seus territórios e conquistar saneamento, desenvolver a economia local e proporcionar acesso à saúde. O desafio do urbanismo é incluir essas mobilizações e transformar a população em uma organização comunitária ativa na tomada de decisões. Conforme a pesquisadora, essa democracia participativa é multi-centrada e busca a inclusão autodeterminada, na qual os direitos das pessoas são reais e praticados.
O recorte de gênero e a relação feminina com a produção do espaço urbano também precisam de ainda mais atenção. A vivência das mulheres, principalmente na conquista de direitos, é uma maneira de transformar as cidades e pensar o planejamento como uma ferramenta política. Usando os recentes protestos no Irã, Faranak destaca como as políticas informais, a compreensão dos recursos da base opressora e o trabalho horizontalizado criam uma rede de resistência e dá voz à uma parcela da população que não é levada em conta. Para ela, há também uma importante abordagem do movimento em que os homens também se identificam com a importância coletiva de contribuir na luta de gênero. “Se queremos avançar, temos que olhar as comunidades oprimidas. No Irã, é uma evidência que a libertação dos homens é através da libertação das mulheres. Por isso, os movimentos estão unificados, e eu creio que para todo o mundo, e inclusive para a sociedade brasileira, é muito importante conhecer e apoiar essa luta para a igualdade de gênero e para a construção de uma sociedade melhor para todos”.
A professora e pesquisadora também deixa uma mensagem pelo 8M, Dia Mundial das Mulheres. “Colocar a vida e o cuidado no centro das decisões do urbanismo é olhar como os oprimidos cuidam de sua comunidade e como esse papel sempre é das mulheres. Temos muito que aprender sobre o trabalho cotidiano e pensar como fazer um planejamento que coloque a vida e o cuidado como algo não negociável. Se mudarmos o centro e os valores dos nossos planos e desenhos, eu creio que teremos um mundo diferente. Qual valor não é negociável?”.
Trocas de experiência
Além dos debates, a “Semana de Planejamento e Política Urbana” também levou Faranak para dentro das salas de aula. Ainda no dia 01/03, a professora conversou com o coletivo do grupo de extensão Planejamento Territorial e Assessoria Popular (PLANTEAR) da UFPR, com o objetivo de trocar experiências e conhecer a realidade paranaense urbana e rural em que o coletivo atua. Acompanharam a conversa, além de Iara, estudantes do Escritório Modelo de Arquitetura e Urbanismo Caracol (EMAU Caracol-UFPR), estudantes e pós-graduandos do Coletivo de Estudos sobre Conflitos pelo Território e pela Terra (ENCONTTRA-UFPR) e os professores de arquitetura e urbanismo, Marcelo Andreoli, de engenharia civil, José Ricardo Faria e de geografia, Jorge Montenegro.
“É importante analisarmos como o planejamento urbano mundial sofre os mesmos males. As cidades crescem pensando na prosperidade da lógica capitalista sem levar em conta a maior parcela de sua população. Entender como essas comunidades periféricas funcionam e partir delas na construção territorial é um desafio que precisa ser fortalecido e central na formação e atuação das e dos profissionais da arquitetura”, afirma Iara. Faranak ainda visitou, no dia 25/02, o Assentamento Contestado do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Lapa (PR), no dia 02/03, a Ocupação Nova Esperança do Movimento Popular por Moradia (MPM), em Campo Magro (PR), e, no dia 01/03, o Vale do Ribeira paranaense, para conhecer as ações de regularização fundiária da prefeitura de Rio Branco do Sul (PR). Após sair do Paraná, ao lado do CEPPUR, esteve no Rio de Janeiro para realizar um trabalho com o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR-UFRJ).
Fotos: Iara B. Falcade Pereira